As Grandes Cartas de Amor (Elizabete Agostinho)

Começo por dizer que a leitura de uma compilação de cartas desta natureza, escritas pelo punho de tantas figuras extraordinárias - Proust, Tolstoi, Byron, Freud, Bethoven, Nietzsche, Stendhal, Dostóievski, Marx, etc - consegue ser perturbadora.

«Não deixa de ser amor, mesmo quando é unilateral. O que é absolutamente surpreendente é a resiliência e a abnegação destes apaixonados que, não sendo correspondidos e às vezes sem esperança de o virem a ser, se entregam de corpo e alma ao objecto do seu amor.»

Parece que, de alguma forma, todos estão tomados por uma doença do espírito - como se tivessem contraído um mesmo vírus, com uma sintomatologia muito específica e similar entre si - que os deixa de certo modo atordoados, profundamente alterados, levando-os a escrever desta forma tão veemente e inflamada, tão convictos da certeza que os anima e irremediavelmente impele a dirigirem-se ao objecto amado, que muitas vezes é um hoje e é outro amanhã.

Com a particularidade que, entre a leitura de uma e outra destas missivas, para nós que as recebemos nesta maravilhosa compilação (que reúne documentos com mais de 200 anos) dista apenas um segundo, o tempo de um suspiro. O que aconteceu entre uma coisa e outra? Quão volátil é o ser humano? Quanto consegue iludir-se a si próprio e ao outro?

A escrita é soberba, mas mais do que a escrita, é a humanidade de cada uma das grandes figuras - que aqui surgem como personagens enlouquecidas, nas mãos caprichosas e erráticas do amor, do erotismo e da paixão - que se evidencia e impressiona.


«São os pequenos grandes momentos do quotidiano que mais revelam as personalidades, desde o desespero quase infantil de Dostóievski ao frio romantismo de Mussolini para a mulher que renegaria e mandaria internar.»

Cada carta é antecedida de um pequenino texto que contextualiza as circunstâncias em que a mesma foi escrita, e é essa breve explicação - que em dois parágrafos resume um mundo de paixões, de intenções e trilhos percorridos - que por vezes consegue ser mais surpreendente do que a própria missiva em si (ou que torna a sua leitura ainda mais impressionante). Dois parágrafos que, tantas vezes e de um só fôlego, desmoronam a magnífica edificação de desejo e ensejo que então tomava lugar no peito de quem escreveu cada uma destas cartas, que agora podemos ler à distância de uma vida.

Pontuação: 8/10
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