A história é-nos trazida por Jim, que se encontra numa viagem de comboio com um amigo de infância (passada numa zona rural do Nebrasca) que o leva a recuperar as memórias do que aí viveu, a partir dos 10 anos de idade, em casa dos avós que o acolheram na sequência da morte dos pais.
Durante esse dia sufocante em que atravessamos o Iowa, a nossa conversa foi sempre parar a uma figura central, uma figura boémia que ambos conheceramos muitos anos antes.
Em torno desta figura central, que conheceu no dia em que chegou a esta terra agreste, por desbravar - aqui muito bem caracterizada - o narrador recua até esse periodo da sua vida, recuperando um conjunto de episódios e vivências marcadas, numa primeira fase, pela simplicidade e a perspetiva muito realista de uma criança de 10 / 12 anos, o que torna a narrativa - nesta parte inicial - pouco elaborada e muito presa ao nível do concreto e observável.
Ántonia, igualmente chegada a esta terra de colonos e apregoadas oportunidades, acaba por seguir um rumo distinto de Jim, que entra para a escola pouco tempo depois, enquanto Ántonia permanece ligada ao trabalho da quinta, onde é esperado que ajude a mãe e os irmãos, e como criada ao serviço de uma família, mais tarde:
Nenhum dos meus colegas de escola era propriamente interessante, mas de alguma maneira eu sentia que, ao travar amizade com eles, estava a vingar-me da indiferença de Ántonia para comigo.
À medida que Jim se desenvolve, também a leitura que faz do mundo se aprofunda, tornando a narrativa mais densa e apelativa:
Esse modo de vida cauteloso era como viver sob um regime de tirania. Os discursos das pessoas, as suas vozes, os seus próprios olhares tornavam-se furtivos e reprimidos. Cada gosto individual, cada apetite natural, era refreado pela cautela. As pessoas que viviam no interior dessas casas, pensei, tentavam viver como os ratos que habitavam as suas cozinhas; sem fazerem barulho, sem deixarem rasto, passando por cima das coisas na escuridão.
O final tem uma tonalidade especialmente doce, de reencontro com os afetos de uma vida passada, de ressignificação e atar de pontas soltas, de reflexão sobre o espaço que as memórias (e as pessoas dentro delas) ocupam em nós. E de como, por vezes, essas memórias se revelam mais vívidas, mais presentes e valiosas do que todas as vivências que lhe sobrevenham.
Pontuação: 7/10
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