São lágrimas, senhor, são lágrimas (Fernando Correia)

Cheguei até este livro depois de ler a carta que Fernando Correia escreveu à mulher, vítima de Alzheimer, no final de "As Grandes Cartas de Amor" e fiquei rendida à sensibilidade, candura e beleza com que o fazia: 

Tenho medo que te vás e não me vejas; que não me olhes, ou olhando, não percebas que te quero e quanto te quero, que aumentes a mágoa das minhas mágoas, espalhadas por anos de procura; que transformes em sombra o sol que aqueceu os meus sentidos.

Isso fez-me procurar saber o que mais teria escrito alguém que escreve assim, colocando-se daquela forma no papel, e ainda que num contexto muito diferente, voltei a encontrar esta voz, a espaços:

Aquele era um dos meus dias de descanso espiritual. Que os aproveito, sempre que me dá para pensar no mistério da vida, no encontro e no desencontro dos seres humanos, na pobreza de alguns espíritos que, pela ordem natural desta passagem imprevista, não sabem ao que andam.

Não sendo este um livro que gire à volta do amor - nem sequer do desamor, é um livro de desalinho, de desequilíbrio profundo na relação com o mundo, consigo próprio e com os outros - também aqui existe doçura, na forma como o autor nos apresenta e reflecte sobre as vidas amarfanhadas, estraçalhadas - pouco pensadas - que aqui nos traz.

Para mim, foi sempre importante pensar no mistério da existência, e eu próprio procuro explicação para alguns factos da vida que ainda não entendi.

São retratos reais de violência severa, exercida de forma infame, que Fernando Correia recolheu e reuniu neste livro que revela um pouco do que está por detrás deste rótulo tão abrangente (por vezes tão difícil de apreender) da violência doméstica.

Classificação: 6/10
Sinopse aqui 

Sem comentários:

Enviar um comentário