E ali estava eu, a desempenhar papéis, a fingir isto e aquilo. (...) O pouco que tinha de meu, renegava-o ou guardava-o para mim mesmo. Havia, por conseguinte, algo de furtivo e duvidoso no meu carácter, não tinha nenhum dos atributos sólidos que encontrei em certas pessoas durante essa época, pessoas que, por essa razão, admirava.
A escrita autobiográfica, quando efectivamente genuína e lúcida, torna-se uma das vias mais interessantes de conhecer essa imensidão de mundos subjectivos. Neste que é o primeiro de seis volumes, Carl Ove - que aqui se dá a conhecer de forma honesta e crua - faz uma incursão pelo período da sua infância (fria e solitária) da juventude (as descobertas e experiências iniciáticas, a par com a perda das primeiras ilusões) e entrada na idade adulta.
Quando chegava a casa, interpretava tudo o que ela dissera e fizera na escola, e isso enviava-me para a mais profunda miséria ou para o mais elevado pico de excitação - não havia meio termo.
A morte do pai, que ocupa neste livro um lugar central, relança o olhar sobre as relações familiares do passado, agora vistas numa perspectiva adulta e um pouco mais esclarecida - por oposição ao misto de confusão e receio que toldava o olhar no tempo em que foram vividas - um emaranhado de laços soltos, desconexos e arredios que Ove esforçadamente procura compreender.
Ele dissera muitas vezes que o nosso pai lhe arrasara por completo a auto-estima em muitas ocasiões, que o humilhara como só ele conseguia fazer, e que isso influenciara alguns períodos da sua vida em que se sentia um inútil e incapaz de fazer fosse o que fosse. Noutros períodos, tudo corria bem, tudo fluía, não havia dúvidas. Para quem estava de fora, só estes últimos eram visíveis.
Pontuação: 8/10
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