Um Gentleman em Moscovo (Amor Towles)


Frequentemente, aqueles que desfrutam da espuma dos dias, que sabem e se dedicam a apreciar a vida nos seus mais ínfimos e deleitosos pormenores, ostentando o tipo de riqueza insusceptível de despojamento e/ou apropriação por outrem, instigam o desdém de outros cujas vidas submergem numa labuta feroz, indubitavelmente digna, mas tantas vezes embrutecedora. 

O tipo de labuta que exige uma entrega fervorosa, devota e absoluta, rejeitando e reprimindo quaisquer outros modos de ser ou estar, não vá a dúvida - ou a constatação - de um certo tolhimento ou pequenez instalar-se e fazer colapsar todo um mundo de convicções, dedicação, entrega e sacrifício.

Vyshinski: Qual é a sua profissão?  
Rostov: Um cavalheiro não tem profissão.
Vyshinski: Muito bem. Então, como é que ocupa o seu tempo?
Rostov: Com jantares, conversas, leituras, reflexão. O habitual.

Condenado pela publicação de um poema, nos primeiros anos do regime Soviético, a viver no interior do Hotel Metropol, onde anteriormente ocupava uma suite de luxo, o Conde Rostov é remetido para um pequeno quarto de arrumos no sótão, onde passará longos anos a partir de então. Em todo esse tempo Rostov nunca perde o domínio - inequívoco e inabalável - sobre si próprio e a sua individualidade. Nenhuma centelha de raiva ou de revolta se vislumbra no seu comportamento, no seu pensamento, na postura que mantém ao longo de anos de subjugação, a que opõe uma absoluta liberdade interior, numa demonstração clara de que nós não somos as nossas circunstâncias, mas aquilo que escolhemos fazer delas. 

Simultaneamente, e contrastando com esta visão alheada dos acontecimentos exteriores, há uma voz de fundo que nos vai dando nota de todas as pequenas e grandes contradições do desejo e da ambição (política, social e individual) que tragicamente se atropelaram na tentativa de implementação de uma revolução. Uma revolução feita por homens, incongruentes e imperfeitos, como todos os homens são. 

Pontuação: 9/10
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