Luz antiga (John Banville)

A vida é feita de pequenas e grandes contradições, incoerências várias, discrepâncias incontornáveis (entre o que pensamos e o que fazemos, entre o desejo e a acção). É disto, todas estas pequenas fagulhas, que é feita a massa humana, e são estes elementos, muito em particular, que a literatura consegue captar, como nenhuma outra forma de arte alguma vez conseguirá.

Não suportaria perde-la. Sabia que era o momento de me levantar e de a envolver nos meus braços, não para a tranquilizar - que me importava o medo dela? - mas para a impedir à força de partir. No entanto, assaltara-me uma letargia peculiar, a aterrada letargia que se apodera do nervoso ratinho quando olha apavorado para cima e vê o falcão a pairar não muito longe, e não conseguia fazer nada senão ficar ali sentado à observá-la, enquanto ela pegava enfiava as cuecas sob o vestido e se baixava para pegar nos sapatos de veludo.

Luz Antiga decorre em dois momentos temporais, separados por cerca de meio século de existência. Um homem recorda o romance tórrido que manteve com a mãe de um amigo de liceu, uma ligação ao mesmo tempo superficial e intensa (porventura o seu único amor, mas ainda assim difícil de classificar como tal) movida por emoções levianas e pueris, mas simultaneamente violentas na sua expressão.

Já me tinha visto chorar, mas de raiva ou porque queria que ela se submetesse às minhas vontades, não assim, daquela forma vil e indefesa, e suponho que inconscientemente se lembrou de que, no fim de contas, eu era um miúdo, um miúdo que ela conduzira para águas muito, muito profundas, em que dificilmente saberia nadar.

Paralelamente, traz-nos rasgos da existência presente desse homem, em tudo tão diferente da juventude e impetuosidade feroz do início da adolescência. Neste interstício, percebemos que há um universo de distância entre o que recordamos e o que aconteceu.

Era aquele tipo de sentimento que eu recordava quando era jovem e tudo era novo e o futuro não conhecia limites, um estado de temerosa e exaltada espera (...). O que é que hoje me batera ao de leve no ombro com o seu diapasão? Era o passado, de novo, ou seria o futuro?

Pontuação: 7/10
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12 Regras para a Vida (Jordan B. Peterson)

Não é verdadeiramente um antídoto para o caos, muita coisa fica de fora para que possamos considerar o mundo um pouquinho mais organizado, mas não deixa de ser uma boa base de reflexão - essa prática hoje tão caída em desuso - sobre o mundo que nos rodeia, sobre o que nos antecedeu, sobre nós próprios, o nosso semelhante e a interacção de todos estes elementos.

É assim a natureza humana. Partilhamos a experiência da fome, da solidão, da sede, do desejo sexual, da agressão, do medo e da dor.(...) Mas temos de escolher e organizar os nossos desejos, porque o mundo é complexo e obstinadamente real. Não podemos ter uma coisa específica, que queremos neste preciso momento, porque esse desejo pode produzir conflitos com os nossos outros desejos, e com os desejos de outras pessoas, e com o mundo.

Questões tão simples quanto evidentes, mas que tão frequentemente ignoramos ou preterimos, em função de uma ilusão ou de uma paz aparente e mais imediata.

Tudo o que está desorganizado é varrido para debaixo do tapete (...) porque a comunicação exige a admissão de emoções terríveis: ressentimento, terror, solidão, desespero, ciúme, frustração, ódio, tédio.

Pontuação: 7/10
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Porque Amamos (Helen Fisher)

Helen Fisher é uma das grandes referências actuais no que respeita ao estudo do amor. A primeira vez que olhei para este livro foi com pena, por não estar ainda traduzido. Pouco tempo depois surgiu a versão em português, que acabei por ler entusiasticamente, ainda que movida primordialmente por razões académicas.

Para que serve a paixão, a intimidade e o compromisso - as três componentes do amor romântico identificadas por Sternberg - e de que forma cada um destes elementos actua por si só, impelindo o ser humano, objecto de todas estas forças poderosas e tantas vezes contraditórias, por caminhos de onde dificilmente sairá ileso? Até que ponto somos livres para decidir o que queremos, o que pensamos, o que sentimos ou o que fazemos?

Cada um de nós tem uma personalidade única, formada pelas nossas experiências de infância e a nossa biologia pessoal. E esta estrutura psíquica, em grande parte inconsciente, faz com que nos apaixonemos por uma pessoa e não por outra.

Para quem gosta de olhar para o amor como algo insondável e absolutamente misterioso - e assim o pretende conservar - deverá manter-se longe destas páginas. Não sendo esse o caso, encontrará aqui uma oportunidade de esclarecer alguns desses caminhos aparentemente inexplicáveis e tantas vezes tortuosos.

Pontuação: 7/10
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